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Normalmente, os casais temem que seus relacionamentos sejam abalados por episódios de traição sexual ou desonestidade emocional. Contudo, ao concentrar a atenção apenas nesses temas, muitas pessoas acabam ignorando uma questão igualmente grave para a saúde da convivência amorosa: a infidelidade financeira — um comportamento capaz de destruir a confiança e comprometer a evolução do relacionamento conjugal.

Como psicólogo e terapeuta de casal, compreendo que qualquer relação deve ser construída com base na confiança mútua. No entanto, é comum que muitos casais não ajam com total transparência quando o assunto é dinheiro. Na prática, são comuns os casos em que um parceiro esconde dívidas, gastos, fontes de renda ou mesmo patrimônio do outro. E é exatamente esse tipo de comportamento que caracteriza a infidelidade financeira.

Uma revisão sistemática conduzida por Hristina Nikolova e publicada no Journal of Consumer Research revela que a infidelidade financeira é um problema real nos relacionamentos. O estudo aponta que esse comportamento é frequentemente motivado por medo da desaprovação, desejo de evitar conflitos ou mesmo pela tentativa de preservar a sensação de autonomia. Ou seja, as pessoas mentem sobre dinheiro na tentativa de evitar conflitos no relacionamento. A pesquisa também mostra que a prática costuma ser minimizada pelos envolvidos, dificultando seu reconhecimento como um problema sério. Por isso, trago essa reflexão para que possamos compreender os impactos dessa prática — que muitas vezes começa com pequenas omissões, mas pode comprometer toda a base de confiança do casal.

O que é infidelidade financeira, afinal?

Infidelidade financeira é o nome dado a comportamentos em que alguém, esconde ou distorce informações sobre dinheiro para evitar conflitos com o parceiro. Isso inclui esconder compras, dívidas, fontes de renda, contas bancárias ou investimentos. Ou seja, tudo aquilo que, por acordo ou expectativa mútua, deveria ser compartilhado e transparente na relação.

Segundo a revisão de Hristina Nikolova e colaboradores, esse tipo de infidelidade envolve atos deliberados e intencionais, cujo principal objetivo é evitar conflitos ou julgamentos. Isto é, não se trata apenas de distrações ou esquecimentos, mas de escolhas conscientes de esconder aspectos da vida financeira. Vale destacar que a infidelidade financeira não depende de um valor alto de dinheiro. Por exemplo, pequenas compras escondidas, assinatura de serviços não combinados, empréstimos não revelados ou mesmo o hábito de mentir sobre o preço de algo já configuram esse tipo de quebra de confiança.

Portanto, para muitos casais, o dinheiro representa mais do que uma ferramenta de sobrevivência: ele simboliza projetos comuns, estabilidade emocional e planejamento de futuro. Por isso, quando ele se torna um segredo ou uma fonte de manipulação, os danos ultrapassam a esfera financeira. Ele alcança o campo afetivo e relacional, especialmente com a quebra de algo essencial para o relacionamento: a confiança.

Bets, jogos online e o novo rosto da infidelidade financeira

A infidelidade financeira sempre existiu, mas nos últimos tempos ela tem ganhado novos contornos, especialmente com a explosão dos jogos de apostas online. Frequentemente — e cada vez mais — chegam ao consultório casos em que um dos parceiros, envolvido em plataformas de “bets” ou jogos como o popular “jogo do tigrinho”, contrai dívidas altíssimas sem que o outro sequer desconfie. Isso, sem dúvidas, é devastador e um claro sinal de infidelidade financeira, já que o rombo só é revelado quando as dívidas ultrapassam todos os limites levando à falência o casal e a família.

Assim, infelizmente, muitos casais só descobrem essas práticas quando o impacto financeiro já é irreversível: o comprometimento das economias, a perda de bens e até a necessidade de vender imóveis para quitar prejuízos causados por decisões unilaterais e secretas. Nesse contexto, a infidelidade financeira ultrapassa o limite da omissão e se transforma em um fator de desestruturação total da vida conjugal e familiar.

Portanto, nesses casos, a dor não está apenas na perda do dinheiro. O dano maior recai sobre a quebra de acordos, na violação da confiança e na sensação de traição profunda. Afinal, quando um parceiro aposta o futuro da família em segredo, não é só o patrimônio que está em jogo, mas o próprio relacionamento.

Estudos apontam que 41% dos participantes casados que compartilham finanças com seus parceiros admitem já ter cometido infidelidade financeira. E mais alarmante: 75% dessas pessoas relatam que o comportamento afetou negativamente seus relacionamentos. Esses números evidenciam como a prática é comum e, ao mesmo tempo, profundamente danosa. Não se trata apenas de um erro isolado — mas de um padrão silencioso que corrói a base da convivência e coloca em risco o futuro da relação.

Casal com dívida escondida pela parceira; crise por infidelidade financeira e apostas. Psicólogo e terapeuta de casal em Salvador  trata dessa questão neste post.
Muitos casais só descobrem a infidelidade financeira quando a dívida já compromete tudo: a casa, a confiança e o amor.”
Elídio Almeida: psicólogo e terapeuta de casal em Salvador

A infidelidade financeira dói tanto quanto uma traição

Você já viveu algum episódio de infidelidade financeira no seu casamento? Se sim, saiba que você não está só. Muitas pessoas se surpreendem ao descobrir que a infidelidade financeira pode causar sofrimentos tão intensos quanto uma traição sexual. E, em alguns casos, até mais profundos. Isso acontece porque o que está em jogo, em ambos ambas as situações, é a confiança. E quando ela é quebrada, o vínculo afetivo também se fragiliza.

Todas as pessoas deveriam saber que em um relacionamento amoroso, o dinheiro não é apenas uma questão prática ou financeira. Ele representa segurança, continuidade, cuidado, futuro. Muitas vezes, os casais fazem planos juntos, assumem compromissos financeiros, constroem sonhos baseados em uma suposta transparência que, quando violada, revela uma camada de engano com consequências devastadoras.

Por isso, o impacto emocional da infidelidade financeira costuma ser subestimado. No consultório, vejo casais lidando com sentimentos de ressentimento, frustração e até perda da admiração e do desejo sexual, porque sentem que foram enganados em um nível íntimo e profundo. Ou seja, em casos assim, o que fica é a sensação de que foram excluídos de decisões que também afetavam diretamente suas vidas.

E assim como acontece nas infidelidades emocionais ou sexuais, o efeito danoso da mentira e da quebra de confiança se repete. Desse modo, cria-se um ciclo em que, a cada segredo revelado, aumenta a sensação de insegurança e o medo de que outras verdades estejam sendo escondidas. Dito em outras palavras: quanto mais se mente, mais difícil se torna restaurar a confiança. Afinal, a ferida não está apenas no que foi feito com o dinheiro, mas na percepção de que o outro escolheu omitir, esconder, trair os combinados. Portanto, destruindo o pacto de cuidado e parceria que sustenta a convivência amorosa.

O que a terapia de casal pode fazer nesses casos?

Quando a infidelidade financeira vem à tona, muitos casais se veem diante de um impasse: seguir em frente com a confiança quebrada ou desistir da relação por não saber como reconstruí-la. É nesse ponto que a terapia de casal pode fazer toda a diferença — não apenas para entender o que aconteceu, mas para resgatar o diálogo, o respeito e, acima de tudo, a confiança.

A terapia oferece um espaço seguro para que cada pessoa possa nomear sentimentos, reconhecer comportamentos e compreender motivações. Mas não apenas isso. O casal também é convidado a refletir sobre o “nós”. Isto é, as consequências das atitudes individuais e a importância de posturas mais cuidadosas para a saúde da convivência. A infidelidade financeira nem sempre nasce da má-fé — muitas vezes, ela vem do medo e da vergonha ou dificuldade em lidar com frustrações. E, claro, o que revela muito sobre a estrutura do relacionamento.

Durante o processo terapêutico, é possível reconstruir os acordos que regem a vida a dois, especialmente os que envolvem dinheiro. Isso não se resume a revisar planilhas ou contas conjuntas, mas envolve realinhar expectativas, valores e objetivos compartilhados.

A terapia também oferece ferramentas para ampliar a transparência, restaurar o diálogo e tomar decisões financeiras em parceria. Muitas vezes, isso exige uma reeducação sobre como cada um lida com o dinheiro, algo enraizado em vivências familiares e culturais. Em muitos casos, contar com o apoio de um especialista em finanças também pode ser fundamental.

Por fim, é importante lembrar: nem todo casal começa com combinados claros sobre dinheiro. Mas sempre é tempo de recalibrar. Com escuta, revisões e compromisso, a relação pode se fortalecer – não apesar da crise – mas por meio dela.

Com verdades, o dinheiro pode ser um aliado do amor

A infidelidade financeira, na maioria das vezes, não começa com grandes desvios ou patrimônios ocultos. Na verdade, tudo isso costuma nascer de pequenas mentiras e omissões que, aos poucos, corroem a base da confiança na convivência. Desse modo, quando o dinheiro — e tudo que ele envolve — deixa de ser um recurso partilhado e passa a ser um segredo, algo essencial se rompe no vínculo afetivo.

Por isso, Falar sobre dinheiro no relacionamento não deve ser um tabu. Falar sobre dinheiro é um gesto de cuidado. Além disso, buscar ajuda profissional — seja com um consultor financeiro de confiança ou com suporte psicológico e emocional — pode ser o primeiro passo para restaurar a confiança, reconstruir os acordos e ressignificar a vida a dois.

Compreender a infidelidade financeira e seu impacto no relacionamento é fundamental. Afinal, como psicólogo clínico e terapeuta de casais, posso afirmar que as questões financeiras estão entre as principais fontes de conflito nos relacionamentos. O estudo Love, Lies and Money: Financial Infidelity in Romantic Relationships, discutido neste post, assim como diversas pesquisas anteriores, mostra que Guardar segredos financeiros é um verdadeiro destruidor de relacionamentos.

Portanto, aja com responsabilidade e comprometimento real no seu casamento. Prevenir é sempre melhor do que remediar crises que poderiam ser evitadas com mais diálogo e verdade. E, se precisar de suporte para isso, não hesite em buscar ajuda profissional especializada no tema.

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