Propaganda enganosa pode gerar sofrimento psíquico. Na semana passada, foi publicada uma notícia inusitada. Nela li que a Grã-Bretanha proibiu a veiculação de propagandas da linha de cosméticos da gigante L’Oreal (fonte). As propagandas foram vetadas porque elas traziam a atriz Julia Roberts em versão Photoshop. Trocando em miúdos, não era bem a Julia Roberts, e sim uma idealização de beleza e juventude criada num computador.
Ao que tudo indica, a versão computadorizada ficou tão distante do real que o órgão britânico regulador da publicidade concordou com a denúncia de uma parlamentar e obrigou a retirada e suspensão da publicidade. A empresa, claro, negou que a propaganda fosse enganosa, mas admitiu que fez alterações na imagem da atriz.
Sofrimento psíquico
A notícia é polêmica, mas traz em si uma questão muito importante: Quanto de sofrimento psíquico é desencadeado numa pessoa em função de eventuais frustrações que surgem após o uso de um produto que não traz o resultado anunciado?
Rapidamente podemos entender que isso traz muita angústia e frustração, pois anuncia-se um produto para deixar a pele da mulher mais bonita, mais jovem, mais delicada, mais clara… e usa-se uma mulher famosa como estandarte daquele produto, o que, provavelmente, levará muitas pessoas a pensar: “ela usa o produto e fica assim, linda!”. Acontece que aquele “assim” não é por obra e mérito do cosmético. É “assim” pela excelência de um trabalho de um programa de computador e de uma pessoa que operou o programa.
Em casos assim, uma pessoa que visualiza a propaganda e vê aquela “linda mulher” estampada no outdoor ou nas páginas de uma revista não sabe o quanto de retoque foi feito e se deixa levar achando que aquele cosmético vai fazer por ela aquilo que “fez” pela atriz. E isso é, no mínimo, uma traição com a consumidora, principalmente pelo sofrimento psíquico que surge em, pelo menos, duas perspectivas:
1) A sociedade dita o padrão de beleza a ser adotado, e nem todos podem obter os artifícios que conduzem ao padrão imposto (custa caro) causando assim sofrimento e levando as pessoas a desenvolver comportamentos que compensem essa “falta”;
2) E aqueles que conseguem obter e usufruir dos recursos que levariam ao padrão de beleza tendem a se frustrar, pois não obtêm o resultado prometido e podem até se culpar por isso, ao invés de atribuir a causa à propaganda enganosa.
Este vídeo mostra o quanto somos iludidos por imagens de pessoas artificiais.
A questão é bastante delicada, mas vemos que as propagandas trazem cada vez mais modelos retocadas e distorcidas. No lugar de pessoas, o que vemos cada vez mais nas revistas e nas propagandas são bonecos de plástico que, quando não estão totalmente retocados pelos programas de edição de imagem, estão cheios de silicone, botox e afins, alterando significativamente os atributos naturais das pessoas.
A questão é muito ampla, mas cabe, ao menos, alguns questionamentos:
Qual o impacto em nossa vida ao acreditarmos, desejarmos e comprarmos as imagens e ideias que são intencionalmente apresentadas diariamente em todos os ambientes?
Será mesmo que queremos ser iguais a essas pessoas de mentirinha?
Ao menos as empresas pensam no sofrimento psíquico que podem causar aos clientes?
Precisamos mesmo delas? Acredito que não.