A maioria dos médicos tem uma rotina exaustiva. Muitas vezes o médico, bem como seus amigos e familiares, só notam o impacto da profissão em suas vidas após anos de experiência. A medicina, ao contrário do que muitos pensam, é, inegavelmente, uma profissão altamente estressante. No entanto, a exaustão causada pelo ritmo de trabalho afeta os médicos desde a faculdade. Ou mesmo antes dela. Não por acaso, os médicos são os que mais são atingidos pela Síndrome de Burnout.
Os estudos voltados à saúde mental e emocional dos profissionais de saúde associam o trabalho do médico a altos índices de situações geradoras de ansiedade e estresse. Isso faz aumentar neles a vulnerabilidade à Síndrome de Burnout. Portanto, a situação é ainda mais preocupante para aqueles que atuam em situações de emergência, cuidados intensivos e ambulatoriais.
Cotidianamente, os profissionais dessa área enfrentam casos de urgência e emergência, alta pressão emocional, plantões consecutivos e pressão por produtividade. Não bastasse, ainda lidam com um somatório de cobranças pessoais, institucionais, dos pacientes, da sociedade e dos familiares. Ainda assim, na maioria das vezes, o ritmo de vida dos médicos faz com que eles tenham mais de um emprego. Ou seja, ao aumentar a carga horária de trabalho, eles diminuem as horas de sono, vivenciam raros momentos de lazer, ficam mais estressados, ansiosos e cansados. Tudo isso tem levado os médicos a serem as principais vítimas da exaustão causada pelo ritmo de trabalho e, consequentemente, da Síndrome de Burnout.
Síndrome de Burnout e a exaustão pelo ritmo de trabalho
A Síndrome de Burnout é conhecida como a síndrome do esgotamento profissional. Ela ocorre especialmente quando as condições de trabalho não são adequadas. Ou seja, a relação do profissional com sua atividade impacta diretamente na qualidade de vida, prejudicando seu bem-estar. Nesses casos, o profissional precisa investir muito mais energia para executar suas tarefas. Tal frequência desencadeia o surgimento de diversos efeitos colaterais. A depressão, o isolamento social e uma série de complicações emocionais estão entre as principais evidências. Contudo, nem sempre esses efeitos são notados em tempo hábil. Isso pode causar estados imensuráveis.
Raramente a população percebe o quão desgastante e exaustivo é o ritmo de trabalho dos profissionais de medicina. Médicos de várias especialidades sentem essa realidade na pele. Isso mostra que a situação é ainda mais delicada para os que trabalham no sistema público de saúde ou em unidades que se preocupam exacerbadamente com a redução de custos para aumentar a lucratividade.
O ritmo de trabalho e o desgaste pessoal enfrentado pelos médicos não são nada fáceis. Isso é conhecido desde o início da formação. Seja na peneira cada vez mais fina para ingressar na faculdade de medicina, nos desafios para concluir a graduação ou nos conflitos vividos na residência médica. Cada médico tem no seu histórico aquele momento vivido à beira de um ataque de nervos.
A faculdade de medicina e a Síndrome de Burnout.
Às vezes, muitos médicos ingressaram na faculdade ainda na adolescência. Movidos pelo sonho de salvar vidas, os estudantes de medicina, geralmente, abdicam de momentos importantes de suas vidas para conquistar esse objetivo. Às vezes, os jovens médicos embarcam no curso sem muita noção da realidade que os espera. Essa transição de uma vida mais despreocupada para uma rotina intensa de estudos nem sempre é fácil. Prova disso é o aumento de tentativas de suicídio entre eles nesse período.
Sim, embora pouco seja dito sobre esse tema, muitos jovens tem ideação suicida ou tentam tirar a própria vida durante a graduação. Diante de tamanhas cobranças e posicionamentos hierárquicos nunca antes vividos, alguns não resistem às pressões. As cobranças que acontecem dentro do ambiente acadêmico são traduzidas pelos estudantes de medicina em uma certeza: é preciso “dar o sangue” e ser o melhor para vencer. Nem todos aguentam a pressão e ficam no meio do caminho.
Problemas emocionais durante a formação
Com isso, estima-se que muitos dos estudantes que ingressam na faculdade de medicina avançam na formação enfrentando diversos problemas emocionais. Decerto que esse índice seja ainda maior na residência médica. A concorrência para se chegar a esse novo espaço de formação e as constantes humilhações praticadas pelos staffs. Em muitos, casos o assédio é também praticado pelos residentes veteranos. Tudo isso torna a vida dos jovens médicos um caos.
Como a duração da residência médica é de até cinco anos, dependendo da especialidade, é comum os residentes optarem por fazer plantões aos fins de semana em outro hospital para complementar a renda. Essa é uma prática tida sobretudo entre aqueles que têm uma família para sustentar. Igualmente ocorrem com osque vêm de outras cidades e precisam pagar aluguel. De tal forma que alguns chegam a trabalhar até 80 horas semanais. Desse modo, é praticamente impossível uma pessoa viver nesse contexto sem enfrentar sequelas, especialmente do ponto de vista psicológico, emocional e social.
Precisamos falar sobre os sentimentos e emoções dos médicos.
Vivemos numa sociedade que nos ensina de forma errada a lidar com os sentimentos e emoções. Geralmente, ensinam-nos a internalizar nossas emoções. Relevar os problemas, acreditar veementemente nos pensamentos positivos e praticar meditação são alternativas apontadas para que todos busquem atenuar o impacto das questões vindas da rotina exaustiva acusada pelo ritmo de trabalho.
Em suma, o melhor recurso para enfrentarmos a exaustão do trabalho é nos posicionarmos ativamente em relação a ele. O caminho para isso é falar sobre nossos sentimentos, emoções e percepções sobre os acontecimentos. Somente agindo no contexto é que daremos nossa contribuição para que o ambiente de trabalho seja modificado e ajustado à necessidade de todos.
Por essa razão, tenho mostrado aos meus pacientes a importância de sermos assertivos. A assertividade nos habilita a expressar adequadamente nossos sentimentos e emoções. Dessa forma, agimos no ambiente, modificando-o e colhendo os frutos dessa intervenção no nosso bem-estar. Por isso, convoco todos as pessoas que lidam com um ritmo exaustivo de trabalho a buscar ajuda.
No próximo post, vou falar mais sobre a importância da fala e como a assertividade pode nos ajudar a ter melhor qualidade de vida profissional, afetiva e social.