Você confia no seu marido ou na sua mulher? A confiança é, sem dúvida, um dos pilares fundamentais de qualquer relacionamento saudável. Justamente por isso, é compreensível que homens e mulheres coloquem a confiança no centro de tudo — embora muitas pessoas acabem vivendo nos extremos: ou confiam cegamente, ou não confiam em absolutamente nada.
À primeira vista, perguntar se você confia no seu parceiro ou na sua parceira pode soar como algo simples. No entanto, na prática, essa pergunta pode ser um verdadeiro gatilho. Especialmente para quem já confiou demais e acabou se arrependendo amargamente. Ou para quem tenta, dia após dia, construir essa confiança, mas vive cercado por inseguranças e suspeitas.
Esses dois extremos mostram o quanto a confiança, por mais essencial que seja, pode se tornar um ponto de tensão nos relacionamentos. É justamente por isso que essa reflexão se faz tão necessária. Na minha prática clínica, acompanho com frequência histórias marcadas tanto pela confiança cega quanto pela ausência total dela — e, em ambos os casos, os impactos são profundos.
Neste texto, quero te convidar a pensar na confiança não como um tudo ou nada, mas como um campo de equilíbrio. Um território que precisa ser construído, cultivado e ajustado continuamente dentro da relação.
Quando confiar demais vira um problema
Existe um tipo de confiança que, embora pareça admirável, é, na verdade, perigosa — e pode colocar o relacionamento em risco. Quando alguém deposita toda a sua confiança no outro, pode, sem perceber, abrir espaço para grandes frustrações na vida a dois. Ainda assim, muitas pessoas enxergam a confiança absoluta como uma forma de blindar e proteger a relação. Algumas, inclusive, constroem essa confiança total simplesmente a partir de falas genéricas e promessas feitas no altar, nas juras de casamento, acreditando que palavras como “você pode confiar em mim, eu nunca vou te trair” bastam para garantir segurança e solidez ao vínculo.
Apegadas a esse ideal de confiança plena, muitas pessoas vivem uma relação em que acreditam que jamais o parceiro cometeria uma traição, por exemplo. Com isso, ignoram sinais evidentes de mudanças de comportamento e desequilíbrio na convivência. Portanto, quando esses comportamentos ocorrem e finalmente vêm à tona, o impacto costuma ser ainda mais devastador. Isso porque a dor não está apenas na quebra da confiança, mas também no choque de perceber que algo que parecia sólido era, na verdade, ilusório e frágil.
Quando um confia demais o outro se aproveita
Ao longo da minha trajetória como psicólogo clínico e terapeuta de casal, acompanhei inúmeros casos em que a confiança excessiva — aquela confiança 100% — foi justamente o que impediu a pessoa de perceber mudanças de atitudes, distanciamentos sutis e brechas que, se notadas a tempo, talvez evitassem sofrimentos maiores. Além disso, é comum que essa confiança total seja usada como brecha por quem trai, partindo do princípio de que o outro jamais desconfiaria de qualquer coisa.
Por isso, o sofrimento de quem foi traído costuma se intensificar em casos em que antes havia total confiança no relacionamento. Pois, além da dor da traição em si, há a frustração de se sentir enganado também pela própria escolha de confiar cegamente. É uma dor que mistura decepção, vergonha e culpa. Porque, no fundo, a pessoa não se sente traída só pelo outro — mas também por si mesma. Como se tivesse falhado ao confiar demais, e agora precisasse lidar com a culpa de ter acreditado no que parecia seguro.

Desconfiar de tudo também destrói a confiança no relacionamento
Se de um lado há quem confie demais, do outro existem pessoas que vivem mergulhadas na insegurança. Refiro-me aos homens e mulheres que interpretam qualquer atitude do parceiro como um possível sinal de traição. Por exemplo, uma simples notificação no celular, um leve atraso, um comentário nas redes sociais, uma amizade no trabalho… tudo se transforma em suspeita.
Nesses casos, o relacionamento deixa de ser um espaço de conexão e passa a funcionar como um campo minado, onde qualquer atitude pode gerar brigas, cobranças e vigilância constante. Nesse sentido, a rotina se torna sufocante: senhas compartilhadas, localização em tempo real, checagens frequentes. E, pouco a pouco, a leveza vai embora, junto com o bem-estar conjugal e desejo de permanecer nessa relação.
Como já abordei em outros textos aqui no site, essa desconfiança pode ter várias origens. Às vezes, vem de relacionamentos anteriores. Outras vezes, surge de exemplos vindos de experiências de terceiros, episódios mal resolvidos no próprio relacionamento, ou até de fantasias alimentadas por quem já carrega, por natureza ou pela própria história pessoal, uma insegurança crônica. Seja qual for o motivo, quando esses fantasmas não são reconhecidos e tratados, acabam penalizando o parceiro atual, envenenando o vínculo e corroendo o afeto e, claro, prejudicando o relacionamento.
Dito de outra forma: desconfiar de tudo também destrói a confiança no relacionamento. Ou seja, ainda que muitas pessoas digam que esse comportamento é uma forma de expressar cuidado ou de evitar que algo ruim aconteça, na prática, ele revela justamente o oposto: a ausência de confiança no relacionamento. Nesse contexto, tudo vira prestação de contas, a intimidade cede lugar ao medo de errar, e o vínculo afetivo se fragiliza. Com o tempo, o casal passa a viver mais preocupado em se defender do outro do que em construir — e desfrutar — um espaço seguro, baseado em respeito e confiança.
Confiança equilibrada para uma relação mais saudável
Como destaquei ao longo do texto, a confiança no relacionamento não pode ser absoluta. Embora muitas pessoas ainda pensem o contrário, posso afirmar — especialmente com base na minha experiência clínica como psicólogo e terapeuta de casais — que confiar cegamente pode se tornar uma armadilha. Em muitos casos, essa confiança total acaba sendo usada como brecha para traições e quebras de compromisso estabelecido pelo casal.
Por outro lado, a confiança também não pode ser nula. Quando está ausente, o relacionamento se torna sufocante, tenso e marcado por inseguranças constantes. No meu entendimento — e é o que costumo reforçar tanto em consultório para os meus pacientes, quanto aqui no site —, a confiança precisa ser equilibrada. Ou seja, confiar e desconfiar do marido ou da mulher pode até ser aceitável em alguns contextos. No entanto, é fundamental que o saldo final seja positivo para a confiança no parceiro e na relação. Sem isso, o relacionamento deixa de fazer sentido.
É importante lembrar que esse equilíbrio não surge do nada. Ele precisa ser construído na prática cotidiana, por meio de diálogo, coerência e respeito mútuo. Por isso, faço questão de destacar: é possível — e saudável — confiar e desconfiar com consciência e equilíbrio, reconhecendo sinais, estabelecendo limites e cultivando juntos um espaço emocional seguro.
Ainda assim, para muitos casais essa harmonia parece distante ou difícil de alcançar. E é justamente nesses casos que a terapia de casal pode ser uma ferramenta valiosa. Com o apoio profissional, muitos casais reencontram o caminho do diálogo, enfrentam suas inseguranças e restauram o vínculo afetivo. Afinal, confiar nem sempre é fácil, mas encontrar esse ponto de equilíbrio é possível — especialmente quando estamos dispostos a encarar os desafios pessoais e os impasses do relacionamento.
Se esse for o seu caso, não hesite em buscar ajuda. Uma relação mais leve e plena pode estar ao seu alcance — e começa com o primeiro passo.