Ao contrário do que muitos imaginam, os atos de violência sexual nem sempre são explícitos. Na verdade, a maioria desses comportamentos deploráveis ocorrem por meio de atitudes sutis. Por exemplo, durante o ato sexual, de maneira disfarçada, unilateralmente alguém decide tirar a camisinha, sem o consentimento do parceiro ou da parceira. Esta prática reprovável recebe o nome de stealthing e, apesar de bastante conhecida e combatida em outros países, é um tema pouco discutido no Brasil. Além disso, não há base legal e jurídica que trate especificamente desse tema, fato que contribui para que os agressores não sejam punidos.
Tirar a camisinha sem falar, o stealthing e a violência sexual
É cada vez maior o número de homens e mulheres que, sem seu consentimento, são expostos a relações sexuais desprotegidas. Na prática, durante o sexo, de maneira sutil, uma das partes retira o preservativo, violando o direito da outra pessoa sobre a autonomia do seu corpo e, especialmente, abrindo brechas para doenças sexualmente transmissíveis, bem como uma gravidez indesejada. Em inglês essa atitude danosa tem nome: stealthing, que em livre tradução teria o sentido de disfarçado, sutil, ou furtivo. Em casos desse tipo, muitos agressores tentam justificar tal ato de violência sexual sob o argumento de que “foi um impulso” ou que “o preservativo saiu sem querer”.
Além de injustificável, a remoção não consensual do preservativo durante a relação sexual é considerada uma violência sexual, pois coloca em vulnerabilidade uma infinidade de mulheres e homens que, em relacionamentos hetero ou homoafetivos, são expostos a uma relações sexuais desprotegidas, sem seu consentimento. Apesar de bastante conhecida e combatida em outros países, o stealthing ainda é um tema pouco discutido no Brasil.
A importância da atualização das leis no combate à violência sexual
O termo stealthing ganhou popularidade em outubro de 2021, após o governador da California, nos Estados Unidos, sancionar uma lei que proíbe, durante o sexo, remover a camisinha sem consentimento. Com isso, a remoção não consensual do preservativo durante a relação sexual passou a ser considerado um delito civil de agressão sexual no estado americano. No Brasil, no entanto, a discussão acerca do stealthing ainda tem passos lentos. Isso se deve ao fato de haver pouco debate sobre o tema, especialmente nas redes sociais. Além disso, não há no Código Penal brasileiro um crime que tipifique diretamente esse tipo de violência. Mesmo assim, de acordo com especialistas da área jurídica, é possível punir os agressores.
Hoje, o ato de retirar a camisinha durante o sexo, sem o consentimento da outra pessoa, pode caracterizar, conforme a legislação vigente, crime de violação sexual mediante fraude. Com isso, o agressor pode ser preso sob pena de 2 a 6 anos, conforme descrito no artigo 215 do Código Penal. No entanto, há quem compreenda que o stealthing não se encaixa perfeitamente no atual dispositivo penal brasileiro. Para este grupo, o argumento é que a relação foi consentida, embora a retirada do preservativo tenha ocorrido de forma unilateral. Ou seja, a ausência de um artigo penal que enquadre essa violência em sua totalidade poderia levar à absolvição ou impunidade do agressor.
Denunciar é importante
Qualquer prática de violência deve ser rechaçada, especialmente as agressões sexuais que se apropriam da vulnerabilidade alheia. Ainda que algumas dessas atitudes pareçam sutis, todas têm grande potencial danoso ao bem-estar e à saúde física e emocional das vítimas. Por isso, é importante publicizar tais condutas para que homens e mulheres expostos a tal situação consigam reconhecer o abuso. Ou seja, quanto mais pessoas tomarem consciência de que o stealthing é uma violação de direitos, mais chances haverá de mudanças, seja nas atitudes e nas leis brasileiras.
Por isso, é fundamental que mais pessoas saibam que a retirada não consensual do preservativo durante o ato sexual é um ato de violência sexual. Afinal, quanto mais pessoas souberem a gravidade deste ato brutal, sem dúvidas, mudanças comportamentais, tanto dos agressores quanto das vítimas, surgirão. Além disso, tornar pública a crueldade do stealthing pode mobilizar os legisladores e o judiciário brasileiro a adequar as leis do país. Consequentemente, novas providências no sentido de preservar a integridade das vítimas e punir seus agressores serão adotadas. Afinal, as denúncias podem levar a justiça e a sociedade a entenderem que o stealthing é uma prática violenta e merece ser coibida.