Ao contrário do que muitos pensam, ser médico não é fácil. A prática da medicina sofreu muitas alterações nos últimos anos. Nesse sentido, o estresse ocupacional tem afetado a saúde psicológica e emocional dos médicos. Em muitos casos, há interferências não só no exercício da profissão, como também na vida pessoal. Além disso, as condições de trabalho estão cada vez mais desgastantes, levando constantemente os médicos à exaustão. Para se ter uma ideia, diariamente, desde a preparação para a careira e durante toda a formação, o médico tem que lidar com cobranças técnicas e emocionais, associadas a uma carga horária excessiva. Como se isso não bastasse, no dia a dia da atuação médica têm que lidar com demandas pessoais, institucionais e sociais cada vez maiores.
Nos últimos anos, os médicos vêm lidando com muitas perdas, entre as quais, destacam-se a qualidade de vida e a autonomia em seu ambiente de trabalho. A exposição a situações cada vez mais estressantes, seja pelas atividades que executam, normas das instituições onde trabalham ou no trato com o público ali atendido, a vulnerabilidade emocional e psicológica dos médicos e médicas no Brasil e crescente.
Além dos mais, os reflexos dessa rotina vêm interferindo na saúde psicológica de cada um deles. Dessa forma, é cada vez mais frequente, os prejuízos que refletem as precárias relações laborais, afetivas, familiares e sociais. Não por acaso, é crescente, entre eles o abuso de substâncias para aliviar o impacto dessa realidade. Consequentemente, um gigantesco quadro de adoecimento emocional e psicológico pode estar associado. Por exemplo, exaustão, depressão e suicídio. Infelizmente, esses são temas raramente discutidos no meio médico.
A representação social dos médicos
Para compreender a saúde psicológica dos médicos, é necessário deixar de lado a representação social que esses profissionais possuem. Isto é, somente abrindo mão dos estereótipos, será possível enxergar as pessoas por trás da profissão. Para se ter uma ideia, geralmente é visto como:
- Pessoa financeiramente rica e bem-sucedida, por isso, não tem problemas;
- Detentor de um conhecimento privilegiado, motivo pelo qual tem a obrigação de saber todas as coisas;
- Pessoa com disponibilidade integral para servir;
- Alguém que ganha muito para fazer pouco;
Lamentavelmente, essa visão é amplamente difundida na sociedade. Com isso, a população generaliza e rotula injustamente a maioria dos médicos e médicas. Não bastasse essa avalanche social, muitos governantes e instituições incitam a população a declarar guerra aos médicos. Agindo dessa forma, transferem a esses profissionais a responsabilidade pelo caos atualmente visto na saúde do país, especialmente na esfera pública. No discurso dessas pessoas, propaga-se que os problemas e a falta de acesso à saúde são culpa dos médicos, fazendo com que estes recebam, em sua atuação profissional, uma carga emocional altamente danosa e muito superior às inerentes à sua atuação.
A saúde psicológica dos médico nos dias atuais
Tudo isso têm levado os médicos a desenvolver habilidades para além de suas funções. Isto é, além do saber técnico, são requeridos a driblar, cotidianamente, as cobranças, insultos e agressões físicas e morais em seu ambiente de trabalho. Afinal, são eles que suportam a insatisfação da população com o sistema de saúde (público e privado). Por conseguinte, a pessoa por trás do jaleco nem sempre consegue sustentar muito tempo essa rotina extenuante.
Piorando ainda mais esse quadro, há também uma cobrança e disputa nem sempre tácitas entre os próprios médicos. Muitas vezes, eles mesmos cobram de seus pares posições sociais que também geram prejuízos emocionais. Por exemplo, especula-se que todos os médicos devem ter super carrões, mega-apartamentos, amplo histórico de viagens ao redor do mundo, festas de casamentos faraônicas… Como se isso fosse um requisito mínimo para quem é médico. Com isso, implicitamente, propaga-se que, para ser médico, a pessoa necessita cumprir todos esses requisitos sociais. Tais ocorrências têm provocado não só a exigência de trabalhar mais para suprir essas “necessidades”. Na prática, elas têm ocasionado também afastamento familiar, social e uma variabilidade de adoecimentos psicológicos e emocionais.
A saúde psicológica dos médicos
Sim, essa é uma constatação lamentável. O contexto em que muitos médicos estão inseridos tem levado a uma perda dos filtros da realidade e à ausência de posicionamentos mais adequados para trazer equilíbrio à vida pessoal e profissional. Além disso, é evidente que à medida que o tempo passa, os médicos vêm perdendo cada vez mais qualidade de vida. Em associação com essa realidade, eles estão entre os maiores consumidores de antidepressivos e ansiolíticos. Não obstante, devido a esse ritmo de vida, muitos deles raramente conseguem manter uma alimentação balanceada, praticar regularmente atividades físicas e ter o devido descanso.
Em síntese, muitos médicos foram, por diversos motivos, a trabalhar exacerbadamente para acumular bens materiais de que raramente conseguem usufruir adequadamente. A maioria tem sido guiada pelas representações descontextualizadas da profissão. Isso é um perigo. Por isso, muitos terminam legitimando um padrão comportamental do qual eles são a principal vítima. Não por acaso, os profissionais de saúde estão entre os maiores acometidos pelo estresse ocupacional, ansiedade, depressão e pela síndrome de burnout.
Por tudo isso, precisamos refletir sobre a saúde psicológica dos médicos e médicas. Ou seja, é necessário e urgente enxergar com mais atenção as pessoas por trás dos jalecos e dos estetoscópios. Compreender a realidade deles fará com que se tenha mais sensibilidade acerca dos problemas que enfrentam o dia a dia deles e de toda a população.
Nos próximos posts, falarei mais sobre a vida psicológica e emocional dos médicos. Se você tem alguma dúvida, crítica ou sugestão, escreva para mim.