Ouço essa pergunta com bastante frequência. Imagino que muitas pessoas também demandam essa resposta dos colegas psicólogos ou dos buscadores da internet. Por essa razão, resolvi escrever este post para esclarecer algumas questões. De antemão, para aqueles que ainda têm a dúvida se “psicólogo passa remédio?“, a resposta é não.
No Brasil, os psicólogos são proibidos de prescrever medicamentos para seus pacientes. Todavia, o mesmo não ocorre em outros países. Mas não é por isso que temos esse dilema. O fato de o psicólogo não passar remédio no Brasil é um assunto que gera muita polêmica entre alguns segmentos da Psicologia. A polêmica se repete em maior grau na sociedade, especialmente pelo desconhecimento da razão de ser dessa proibição. Afinal, precisamos entender por que o psicólogo não passa remédio, já que outros profissionais de saúde prescrevem?
Só médico pode passar remédio?
Não. Há outros profissionais de saúde que podem prescrever. Porém, existem critérios e normas para isso. Dessa maneira, precisamos saber quais são os profissionais que podem receitar remédio aos seus pacientes e em quais circunstâncias. Vejamos quem são esses profissionais:
- Médicos
- Cirurgiões Dentistas (para uso odontológico)
- Médicos veterinários (para uso veterinário)
- Enfermeiros (quando fizerem parte de uma equipe médica)
- Farmacêuticos (remédios que não exigem a prescrição médica)
- Nutricionistas (apenas suplementos alimentares)
Por que psicólogo não passa remédio?
Algumas pessoas acreditam que os psicólogos são contra o uso de medicamentos, especialmente remédios voltados aos transtornos mentais e questões emocionais. Isso não é verdade. Em muitos casos, a intervenção medicamentosa é necessária para tratamento e melhora do paciente. Mas não é por serem contra o uso de medicamento que os psicólogos não passam remédio. Existe uma razão muito especial para isso.
Todos sabem que os remédios podem ter uma série de efeitos colaterais ou reações adversas, também conhecidas por RAM – Reação Adversa ao Medicamento. A depender da intercorrência, alguns fármacos podem provocar até parada cardiorrespiratória. Isso é muito grave. Por essa razão, a prescrição de remédios, por padrão, é um comportamento do médico. Afinal, em tese, ele é o profissional mais preparado para lidar com eventuais contratempos decorrentes do uso de um medicamento. O médico é quem estaria habilitado a adotar condutas mais complexas para evitar desdobramentos mais sérios provocados pelos medicamentos.
Seguindo a mesma linha, os dentistas, veterinários e os demais profissionais podem prescrever dentro de sua área. Em tese, eles saberiam prever ou adotar ações terapêuticas em casos anormais. Contudo, ainda paira a dúvida: por que psicólogo está fora desse grupo? A resposta é simples.
Não é só passar um remédio.
Primeiramente, nós psicólogos não saberíamos lidar com possíveis anormalidades provocadas pelos efeitos colaterais ou reações adversas dos medicamentos. Ainda que saibamos sobre transtornos mentais e as substâncias que agem sobre os quadros psicopatológicos, não temos habilitação para lidar com os desdobramentos das intercorrências previstas e imprevistas em cada medicamento. Ou seja, prescrever um remédio não é somente o ato de indicar determinada substância, é saber lidar com ela em todos os seus desdobramentos.
Em segundo lugar, as pessoas que procuram psicólogos com a intenção de obter um remédio não são só desinformadas. O principal interesse é encurtar o acesso a determinados tipos de substâncias. Além disso, não é qualquer remédio que elas buscam. O real interesse está nos remédios controlados, como os psicotrópicos e os benzodiazepínicos, de forma geral. Sob o mesmo ponto de vista, essas pessoas evitam tratar o problema em sua raiz. Para elas, retirar os sintomas é sinônimo de resolver os problemas. Estão equivocadas.
Em terceiro lugar, já tem gente demais prescrevendo remédios. Isso é um perigo, pois tal prática tem levado muitas pessoas a usar medicamentos sem necessidade real. Não obstante, a indústria farmacêutica tira proveito desse comportamento irresponsável. Ela incentiva e se beneficia com a impulsividade e a imprudência da população. Desse modo, não é apenas pela falta de habilitação, mas sim por todo esse contexto que é vedada aos psicólogos a prática de prescrever medicamentos. Afinal, existem outras formas de atuar e intervir na melhora dos pacientes sem necessariamente recorrer aos fármacos. Só para exemplificar: nos casos em que é verificada essa necessidade, faz-se a recomendação ou encaminhamento para um médico psiquiatra.
Um alerta!
Em conclusão, precisamos repensar sobre o uso indiscriminado de medicamentos. Culturalmente, temos a prática de primeiro recorrer aos medicamentos como forma de melhorar ou fugir dos problemas. Isso é ainda mais acentuado quando falamos sobre questões emocionais e psicológicas.
Este alerta deveria tocar não só aquelas pessoas que acreditam que psicólogo passa remédio. A atenção deve ser adotada por todos que irresponsavelmente “receitam” remédios para familiares e amigos. Infelizmente, é muito comum em nossa cultura indicar remédios sem seguir critérios mais rigorosos. Aliás, as pessoas se apegam ao simples fato de ter feito uso de algum remédio, ter ouvido falar sobre os possíveis benefícios a partir de uma propaganda e, assim, bancam os doutores da Farmacologia. Isso sem falar dos casos de automedicação. Parece que poucos sabem, mas somos um dos países com mais casos de intoxicação provocada por automedicação.