No Brasil, de acordo com a Lei 7.210, dá-se o nome de prisão em regime semiaberto à pena destinada às condenações cuja pessoa tem o direito de trabalhar e fazer cursos fora da prisão durante o dia, mas deve retornar à unidade penitenciária à noite. Tal condição se assemelha à vida amorosa de algumas pessoas que se têm vínculos sexuais e afetivos duplos. Para muitas delas, o argumento de uma possível transição dá sentido à manutenção desses relacionamentos paralelos. Todavia, frequentemente, nota-se que essa narrativa não se traduz nas prometidas atitudes transitórias. Isso leva a grandes desgastes e acarreta sofrimento a todos os envolvidos.
A lógica do semiaberto e relacionamentos amorosos
Não há prisão perpétua no Brasil e o cumprimento de penas sempre tem o objetivo de ressocializar os condenados. Por isso, em alguns casos, uma das etapas de reintegração dos infratores à sociedade tem como premissa o regime semiaberto. A lógica dessa norma é dar condições para que o infrator desenvolva novos vínculos e habilidades antes de deixar completamente a prisão. Desse modo, comparar o regime semiaberto ao meio de transição que algumas pessoas adotam para construir um relacionamento enquanto se abdicam de outro convívio, não quer dizer que a vida a dois seja uma prisão. Na verdade, é fato que algumas pessoas não estão satisfeitas na convivência com seus pares e, obviamente, têm o direito de tentar construções amorosas mais prósperas.
Nesse sentido, muitas adotam uma lógica similar ao que prega o regime semiaberto para “conhecer” outras pessoas. Isto é, construir outro relacionamento simultaneamente à relação que não representa mais a felicidade plena. Com isso, elas se sentem autorizadas a manter experiências e vínculos sexuais ou afetivos duplos, vivendo as relações concomitantemente. Entretanto, aquilo que seria uma transição, costuma tornar-se algo permanente.
O melhor dos dois mundos
Frequentemente as pessoas que convivem ou são expostas a relacionamentos paralelos se questionam e também são questionadas sobre o sentido dessa pretensa transição. Para elas, de algum modo, a lógica deveria ser a seguinte: “se tá ruim, separa de uma vez e fica livre para investir num novo relacionamento”. Todavia, pensar dessa maneira significa deixar de considerar um aspecto fundamental. Isto é, se a relação que se pretende abandonar fosse totalmente ruim, essa decisão seria mais fácil. Em termos práticos, é possível que apenas uma fração desse convívio deixa a desejar, como o sexo, por exemplo. Assim, os vínculos, sejam eles qual for, ainda têm um peso maior e acabam sustentando essa relação.
Consequentemente, essa divisão também inviabiliza a entrega completa e o devido investimento na nova possibilidade de relação. Na prática, um relacionamento acaba compensando o outro e aqueles que acreditam na falácia da transição são cooptados pelo melhor dos dois mundos. Porém, isso não representa segurança e felicidade para os envolvidos.
Acumulando Vantagens
Apostar na ideia da transição, especialmente considerando que uma relação se propõe a compensar o que falta na outra, faz com que as pessoas sustentem tais vivências até o limite do (in)suportável. Ou seja, além de geralmente não tomarem a decisão que parece sustentar essa lógica, também alimentam fantasias de que cada um desses relacionamentos pode dar certo. Além disso, criam expectativas em todos os envolvidos e, pela incongruência desses fatos, todos terminam frustrados e em sofrimento. Por isso, é fundamental que as pessoas expostas ou envolvidas em relações desse tipo reflitam sobre esse tipo de atitude e envolvimento. Afinal, assim como no regime prisional, a lógica do semiaberto só reflete melhorias se as experiências estão amparadas em aprendizados e decisões promissoras para o futuro. Ou seja, geralmente aqueles que adotam esta manobra intui, primordialmente, o acúmulo de vantagens.