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A música popular brasileira sempre se apoiou nos dissabores dos relacionamentos para tocar os corações do público e, consequentemente, fazer sucesso. Nesse sentido, surgiu o estilo musical conhecido como “sofrência“. Nele, do sertanejo até as mais requintadas vozes da MPB,  as desilusões amorosas, o ciúme, as traições e, obviamente, o fim dos relacionamentos, sempre estiveram presentes no eixo destas canções. Em geral, o estilo da música-sofrência propaga a ideia de que terminar um relacionamento é admissível, desde que esteja acompanhado de algum sofrimento. Contudo, é importante refletir e questionar sobre essa lógica, bem como compreender que o namoro foi feito para acabar, seja ao evidenciar a incompatibilidade entre os pares ou para evoluir rumo a outros estágios mais robustos da relação.

O namorar é um estágio da relação

Num post anterior aqui no blog, foi discutida a razão pela qual as pessoas gostam tanto de música (veja aqui). Em suma, as canções contribuem para identificar, nomear e expressar determinados sentimentos e emoções, especialmente no campo dos relacionamentos afetivos. A questão é que muitas dessas composições, em particular as que integram o estilo sofrência, induzem o público ao equívoco de considerar que o término de um relacionamento é intolerável e deve ser encarado com muito sofrimento. Na verdade, é importante compreender que é natural surgir diferenças ou incompatibilidades durante o convívio. Assim, estas constatações podem servir para ajustar a relação em prol da continuidade ou conduzirem o casal ao fim do relacionamento. Em razão disso, o namoro foi feito para acabar. Afinal ele é um período de conhecimento entre as partes. Isto é, passado esse estágio, é esperado que as pessoas dêem novos rumos à relação.

Por medo de ficar só, muitas pessoas temem a ideia de que todo namoro foi feito para acabar. Inclusive, isso pode ser muito bom.
Por medo de ficar só, muitas pessoas temem a ideia de que todo namoro foi feito para acabar.

O namoro é uma fase de teste

A ideia de que o namoro foi feito para acabar certamente vai na contramão dos ideais cultivados por muitas pessoas, especialmente aquelas que se identificam com a cultura da sofrência. Contudo, este grupo precisa compreender que o namoro também é uma fase de teste para conhecer o outro. Isto é, o namoro é o período de analisar se há sintonia e compatibilidade entre o casal. Por isso, ao perceber que existe uma conduta inegociável na relação, é natural que uma das partes, ou ambas, opte pelo fim do relacionamento. Logo, deveria ser normal aceitar isso com mais naturalidade, apesar da frustração inerente ao término. No entanto, além da amargura extrema refletida nas músicas-sofrência, muitas pessoas ultrapassam o limite do razoável na tentativa de dar continuidade à relação; mesmo diante das incompatibilidades de convivência. Outras, contudo, receiam as críticas e o julgamento social e mantêm a relação, ainda que insatisfeitas. 

Todo namoro foi feito para acabar um dia

Quando as pessoas compreendam que o namoro foi feito para acabar, a sofrência extrema também terá um fim. Do mesmo modo, os atos de intolerância decorrentes do término de um relacionamento, a exemplo do feminicídio, serão impactados. Assim sendo, o fim do ciclo amoroso poderá ser conduzido e aceito com mais leveza. De qualquer forma, para não ficar apenas no campo pessimista, vale lembrar que é igualmente natural que o namoro termine de modo a elevar o relacionamento a outros patamares, a exemplo do casamento. Ou seja, todo namoro foi feito para acabar um dia, inclusive para dar lugar a um modo de relacionamento mais estável. Pensei nisso!

Elídio Almeida

Psicólogo em Salvador, formado pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) e especializado em Terapia de Casal e Relacionamentos (CRP). Possui também pós-graduação em Psicologia Clínica pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Dedica-se à prática clínica, oferecendo acompanhamento terapêutico a casais, famílias e atendimento individual para adultos. Além disso, ministra cursos e palestras na área.

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